De acordo com entrevistas concedidas por Adrian Lamo à Glenn Greenwald da Salon.com, a forma como Bradley o contactou e como toda a história aconteceu levanta muitas suspeitas sobre as ações de Lamo e também do jornalista (e ex-hacker) da revista Wired, Kevin Poulsen. Lamo alega que no dia 20 de Maio ele recebeu vários e-mails de Bradley, mas que não os leu porque estavam criptografados, usando uma chave PGP antiga dele. Ainda de acordo com Lamo, Bradley (que não o conhecia) o encontrou através de uma busca no site Twitter, por usuários que haviam postado a tag "#wikileaks". E que dentre as milhares de pessoas que encontrou, Bradley resolveu escolher Lamo para conversar.

Adrian Lamo disse que mesmo não lendo os emails e sem saber de quem se tratava, resolveu responder, convidando essa pessoa estranha para um bate-papo no chat IM da AOL. Ele também disse que Manning lhe enviou novos emails criptografados usando a sua chave PGP atual. Mas que ele nunca teve interesse em descriptografar e ler esses emails. No dia 21 de maio aconteceu a primeira conversa via bate-papo entre Adrian Lamo e Bradley Manning. De acordo com o artigo publicado por Kevin Poulsen na revista Wired sobre a prisão de Bradley, Lamo alega que ele notificou os agentes federais logo depois desta primeira conversa.

O que levanta suspeita nesta história toda são algumas questões: a relação de Adrian Lamo e Kevin Poulsen; suspeita de violação da ética jornalista por ambos e pela revista Wired; o plano revelado pela própria wikileaks, em 2008, do Pentágono, onde ele fala sobre uma estratégia para acabar com o site; e a principal de todas: o que realmente aconteceu entre Lamo e Bradley, o que levou o soldado a confiar em Lamo?

Voltando à história, Adrian Lamo também afirma ter entregue todos os emails de Bradley para o FBI sem nunca ter lido nenhum deles. Lamo continuou a conversar com Bradley durante vários dias, enquanto ele trabalhava como informante para o FBI e o exército. No artigo de Glen Greenwald do site Salon.com, Poulsen fala que "no final do mês de Maio Lamo o contou sobre ter sido contactado por um analista de inteligência do exército, que tinha vazado 260.000 cabos do Departamento do Estado para 'uma nação estrangeira'. Adrian falou que já tinha entrado em contato com o governo e que estava se reunindo pessoalmente com o exército e o FBI para entregar os logs (registros) da conversa." E ele diz que Lamo "recusou a dizer o nome do analista" para ele. Mas fica claro que durante os dias em que Adrian Lamo conversava com Bradley, interrogando-o através do bate-papo da AOL com o FBI e o exército acompanhando tudo, sem o conhecimento de Manning, Poulsen sabia que isso estava acontecendo.

No dia 27 de maio, Lamo ficou sabendo que Bradley Manning tinha sido preso e levado para uma prisão no Kuwait. No mesmo dia 27, antes de Adrian Lamo se encontrar com o FBI e o exército, de acordo com um artigo da Columbian Journalism Review, Poulsem viajou na mesma data para Sacramento e "passou algumas horas com Lamo" para pegar os logs, foi quando ele viu pela primeira vez o nome de Manning e os detalhes da conversa entre ele e Lamo.

A justificativa dada por Ardian Lamo para entregar o soldado Bradley aos agentes federais e ao exército, era para "não colocar vidas americanas em risco". Típico argumento do governo dos EUA e da extrema direita daquele país. Na verdade, as imagens que Bradley vazou para o mundo fazem parte do cotidiano das pessoas que vivem no Iraque e no Afeganistão, não são nenhuma novidade. Por isso, não faz sentido dizer que tais imagens incentivariam ataques às tropas norte-americanas naquele país.

Adrian Lamo é uma figura carimbada da cena 'hacker' de San Francisco, famoso pela fama de estar sempre querendo aparecer na mídia. Jacob Appelbaum, desenvolvedor do projeto Tor e que conhece Lamo há anos, disse na mídia que a "única preocupação" de Lamo sempre foi "ter publicidade para Adrian." A 'parceria com Poulsen serve para satisfazer essa necessidade de Lamo. São vários os artigos publicados por Poulsen sobre as aventuras de Lamo nos últimos anos. São anos de convivência, mas que por uma razão ou outra ambos negam que haja amizade. Para Poulsen, Lamo é apenas uma "fonte".

Antes da bomba sobre como Lamo ajudou o FBI a prender o soldado Bradley, no mesmo dia em que Lamo recebeu o primeiro email criptografado, 20 de maio, Poulsen publicou um artigo na revista Wired sobre Lamo contando a história dele ter sido preso por possuir remédios sem prescrição, e depois ter sido internado involuntariamente numa clínica psiquiatra e por fim diagnosticado com síndrome de Asperger. Após quase dois anos sem aparecer na mídia, mais uma vez Lamo era assunto para as histórias de Poulsen na revista Wired.

Enfim, no dia 6 de Junho Poulsen publica o seu furo de reportagem sobre a prisão do soldado Bradley, responsável pelo vazamento do vídeo "Assassinato Colateral" à wikileaks. Vídeo que mostra soldados norte-americanos matando, de forma deliberada, cerca de 15 civis - incluindo dois jornalistas da Reuters - e ferindo outros, inclusive duas crianças, no Iraque. No artigo ele publica apenas partes dos logs da conversa de Lamo com Bradley que lhe foi entregue, o que dificulta muito saber o que realmente aconteceu.

E deixa a pergunta mais óbvia: o que fez Bradley Manning confiar em Adrian Lamo? Em uma hora de entrevista com Glen Greenwald, Lamo fala que "ele disse a Manning logo no começo da conversa que ele era um jornalista e, por isso, poderia oferecer a Manning confidencialidade sobre tudo o que estavam conversando, graças a Shield Law('Lei Escudo') da California" - que protege as fontes de jornalistas. Lamo também disse a Bradley que ele era um ministro religioso e que poderia tratar a conversa deles como uma "confissão". Ele nunca falou se Bradley recusou ou rejeitou a oferta de confidencialidade. Agora, já para a Yahoo! News, ele disse que deixou claro para Manning que não estava trabalhando como jornalista e que Manning recusou a oferta. O que prova que Adrian Lamo anda contando várias versões da mesma história e que sem os logs completos fica impossível saber o que realmente aconteceu.

Vários jornalistas já pediram a Wired para verem os logs completos da conversa, mas ela se recusa a mostrá-los alegando que existem partes sobre a vida pessoal de Bradley e também de segurança nacional. Mas Lamo disse a Salon.com que "há partes dos logs que (a) são de extrema relevância ao que aconteceu; (b) não tem nada a ver com questões pessoais de Bradley; (c) não podem ser encontradas em nenhumas das partes publicadas pela Wired". No dia 10 de Junho o Washington Post publicou partes dos logs (que não foram publicadas pela Wired) provando que a Wired está detendo logs que não tem nada a ver com "questões pessoais" ou de "segurança nacional".

Bradley Manning é um herói.

Partes do log da conversa onde Bradley justifica porque ele fez o que fez:

"Bem, foi enviado para [wikileaks] e só Deus sabe o que acontecerá agora! Espero que uma discussão mundial, debates e reformas, senão estamos condenados como espécie e eu vou desistir oficialmente da sociedade que temos,se nada acontecer. A reação ao vídeo [Assassinato Colateral] me deu imensa esperança.." "....Eu quero que as pessoas vejam a verdade... independente de quem elas sejam... porque sem informações não podemos tomar decisões conscientes como um povo."

Bradley conta o incidente que o fez questionar pela primeira vez a guerra no Iraque. Foi quando ele foi instruido para trabalhar num caso de umas pessoas presas por distribuir literatura "insurgente". Só que quando ele traduziu o que estava escrito ele viu que era apenas uma crítica acadêmica à PM Maliki (Primeiro Ministro do Iraque). Ele comunicou o fato ao seu superior, que o mandou calar a boca e a ajudar a deter mais gente.

Ao ler as partes dos logs da conversa fica claro que Bradley agiu da forma mais nobre que alguém poderia agir diante de tanta corrupção e crime em nome de uma guerra que começou com uma mentira (as armas de destruição massiva que o Iraque supostamente tinha). A intenção dele é clara:

Bradley: "Se eu fosse alguém mal-intencionado poderia vendê-los à Rússia e a China e ganharia uma grana."
Lamo: "Por que não o fez?"
Bradley: "Porque são dados públicos" ? "Eles pertencem ao domínio público - informação deveria ser livre - pertencem ao domínio público - porque outro Estado simplesmente tiraria proveito da situação... tentar obter alguma vantagem.. se estiver livre por aí.."

Nos EUA, o caso de Bradley está sendo comparado com o de Daniel Ellsberg. Citando a wikipedia: "é um ex-analista militar norte-americano, que causou um furor no governo e na opinião pública em 1971, quando forneceu ao jornal The New York Times os Papéis do Pentágono, documentos secretos do Departamento de Defesa contendo detalhes sobre as atividades das Forças Armadas dos EUA durante a Guerra do Vietnã. A publicação dos documentos alertou o povo norte-americano sobre como eles foram enganados por seu próprio governo a respeito da guerra." O próprio Daniel Ellsberg disse no programa Democracy Now que: "...o que eu escutei de Assange [wikileaks] e Manning até agora - e eu não conheço nenhum dos dois - é que eles são meus novos heróis".

Existem muitos soldados que estão tomando uma posição contra as guerras no Iraque e no Afeganistão. Mas Bradley Manning não somente tomou uma posição contra como fez algo a respeito. Ele ajudou a fazer o que Daniel Ellsberg fez em relação a guerra no Vietnã. Ele ajudou a alertar o povo norte-americano sobre como ele está sendo enganado por seu próprio governo a respeito das guerras. Os familiares das vítimas mostradas no vídeo "Assassinato Colateral", declararam que "Justiça foi o que Manning fez. O exército deveria condecorá-lo e não prendê-lo."

As acusações contra Bradley foram apresentadas no começo de junho, e é difícil definir quanto tempo de pena ele enfrentará. Depende muito da interpretação da acusação, mas o cálculo parece ser entre 52 anos de prisão.

Wikileaks:

Além do vídeo "Assassinato Colateral" Lamo disse que Bradley também vazou outro vídeo sobre um ataque no dia 03 de Maio de 2009 no Afeganistão onde um bombardeiro matou centenas de civis. De acordo com um relatório da organização Human Rights Watch (HRW) sobre este ataque, a informação dada pelo exército dos EUA era de que a responsabilidade pelas vítimas civis era do Taliban, por usar civis como escudos humanos. Mas os moradores entrevistados pela HRW relataram uma outra versão da história. Falaram que depois de um confronto entre Taliban e as forças dos EUA e do Afeganistão, quando a maioria dos insurgentes já haviam deixado a Vila Garani, cerca de oito bombas foram lançadas na Vila pelo exército norte-americano e foi aí que a maior parte dos civis foram mortos.

Lamo também alega que Bradley entregou centenas de milhares de cabos secretos diplomáticos para a Wikileaks que mostram "negociações políticas criminosas". Não é possível confirmar se esses documentos estão realmente com a Wikileaks, mas é bem provável que eles possuem alguma coisa e que poderão publicá-la a qualquer momento. Aparentemente, é por temer a publicação deste material que o Pentágono anda caçando o porta-voz do site, Julian Assange. Entretanto, não é de hoje que o Pentágono se preocupa com a Wikileaks. No dia 15 de Março de 2010, a Wikileaks publicou um relatório da Agência de Contra-Inteligência dos EUA, de 32 páginas, feito em 2008 sobre o site. O documento descreve uma operação para destruir a credibilidade do site e acabar como o seu potencial de vazar documentos que podem expor ações criminosas do governo dos EUA:

"Sites como o wikileaks.org tem a confiança como o seu centro de gravidade mais importante, protegendo o anonimato e a identidade do confidente, informante ou denunciante. Identificação bem sucedida, acusação, cessação de relação laboral e exposição das pessoas que vazaram as informações por parte dos governos e das empresas afetadas pelas informações postadas em WikiLeaks.org, prejudicaria e potencialmente destruiria este centro de gravidade e dissuadiria outros de tomar medidas similares."

Não é novidade para ninguém este tipo de ações secretas promovidas pelo governo dos EUA para defender os seus interesses e proteger suas ações criminosas em prol desses interesses. Por exemplo, para os latinoamericanos é muito fácil recordar a operação CONDOR e também outras ações que colaboraram com a implementação de ditaduras militares por toda a América Latina durante décadas. Ditaduras que destruiram governos democraticamente eleitos, que se negavam a seguir a Cartilha do Consenso de Washington. Para os movimentos sociais dos EUA dos anos 60 também é muito conhecida a operação COINTELPRO, elaborada pelo governo para acabar com os movimentos daquele país. Movimentos como os panteras negras, contra a guerra do Vietnã, pelos direitos civis, pela liberdade de expressão etc, foram todos atingidos por essa operação.

Deste a sua criação em Dezembro de 2006, o site Wikileaks já recebeu milhares de documentos vazados de todo o mundo. Muitos consideram o site um lugar seguro para publicar documentos sensíveis de governos e empresas que denunciam crimes e corrupção e que garante o anonimato, como uma nova forma de se fazer jornalismo. A diferença entre a Wikileaks e os grandes meios de comunicação é que os segundos têm a mania de 'sentar' em informações importantes para o interesse público em cumplicidade com os governos e empresas denunciados. Por exemplo o New York Times 'sentou' por um ano na denúncia de que a administração Bush espionava ilegalmente os cidadãos norte-americanos, até o Bush ser reeleito sem problemas.

Alguns destaques das denúncias publicadas pela WikiLeaks:

1. Daniel arap Moi: Wikileaks publica documentos provando corrupção do ex-lider queniano (presidente durante 1978-2002) Daniel arap Moi. Muitos meios de comunicação falaram que a denúncia fez mudar o caminho das eleições naquele país.

2. Procedimentos Operacionais Padrão para Camp Delta/Guantánamo: o documento publicado pela Wikileaks no dia 7 de Novembro de 2007, revelou algumas das restrições impostas aos detidos, incluindo o protocolo de esconder alguns prisioneiros durante as visitas do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, algo que os militares dos EUA haviam negado repetidamente no passado. Depois no dia 3 de Dezembro a Wikileaks lançou uma versão nova, de 2004, do manual junto com uma análise detalhada das mudanças entre as versões.

3. Os famosos e mails da Unidade de Pesquisas sobre o Clima: que causaram uma crise durante a última conferência climática.

4. Escândalo do Petróleo no Peru, 2008: No dia 28 de Janeiro de 2009, Wikileaks publicou 86 gravações telefônicas de políticos e empresários peruanos envolvidos no escândalo "Petrogate".

5. Wikileaks publicou um relatório interno da empresa petroleira e de transportes Trafigura Beheer BV, da Suiça, que fala sobre o despejo de lixo tóxico na Costa do Marfin, que de acordo com a ONU afetou 108.000 pessoas.

extraído do
CMI - Centro de Mídia Independente