segunda-feira, 18 de abril de 2011

WikiLeaks: Várias embaixadas dos EUA opinam sobre o MERCOSUL


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[cabeçalho aqui omitido]
Traduzido e comentado pelo pessoal da Vila Vudu

Excerto do item SECRETO do telegrama 07ASUNCION396
A íntegra do telegrama não está disponível. Nessa tradução omitiram-se vários trechos de pura repetição de matéria jornalística.
Tradução de trabalho, não oficial, para finalidades didáticas.
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NOTA DOS TRADUTORES: 

Esse telegrama não tem qualquer importância, além de deixar bem claro que o grupo GAFE das “comunicações” no Brasil (Globo, Abril, FSP e Estadão) está TOTALMENTE na gaveta da Embaixada dos EUA e que não há imprensa independente no Brasil. Engraçado observar também que os EUA perdem dinheiro nessa empreitada: o grupo GAFE escreveria exatamente o que escreve, também “de grátis”.

Para que se avalie a extensão da baixa qualidade do serviço diplomático dos EUA, em comparação ao serviço diplomático do Brasil nos governos Lula-Dilma – o que dá ânimo e alegria pra prosseguir –, deve-se comparar esse telegrama e o que se lê em: Samuel Pinheiro Guimarães, “Nossos aliados são os vizinhos – Brasil/Estados Unidos: a rivalidade emergente”, em 5/3/2011, no Blog O Outro Lado da Notícia (e em vários blogs. A blogaria não está na gaveta da embaixada dos EUA – o que também é ideia estimulante).
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1. RESUMO: Durante a Conferência de Maio 8-9 [2007] do Cone Sul / Brazil COM, no Rio de Janeiro, os cinco Embaixadores do Cone Sul discutiram os planos agressivos de Hugo Chavez para criar um movimento bolivariano unificado em toda a América Latina, focando as atividades em seus respectivos países. Esse relatório é produto das observações e análises apresentadas por esses vários embaixadores [dos EUA]. 

O presidente venezuelano Hugo Chavez busca agressivamente dividir a América Latina entre os que aceitam suas políticas populistas antiamericanas e mensagem autoritária e os que buscam criar e fortalecer políticas e instituições democráticas baseadas no livre mercado. No cone Sul, Chavez trabalha para conquistar adeptos para seu campo, mediante o que parece ser um plano multifacetado que depende, fortemente, da capacidade de Chavez para oferecer energia e projetos grandiosos baseados em petrodólares. 

Alguns líderes regionais, em regiões miseráveis, podem ser tentados a deixar-se seduzir, mas muitos parecem interessados apenas em tomar o dinheiro de Chavez e nada dar em troca além de ‘conversa fiada’ [orig. paying only lip service] de apoio a suas políticas. E há também os que, na região, francamente rejeitam o homem. Seja como for, Chavez não deve ser subestimado. O dinheiro fala alto, as instituições democráticas ainda são frágeis na região; e a economia de livre mercado ainda não garantiu soluções consistentes nos países do Cone Sul, que continuam social e politicamente doentes. 

Essa embaixada reúne nesse telegrama as opiniões coletivas de vários embaixadores sobre que ameaças essa campanha implica para os interesses dos EUA, mas é evidente que precisamos de mais recursos (e de recursos mais flexíveis) e ferramentas para resistir aos esforços de Chavez, que quer conseguir domínio cada vez maior sobre a América Latina, à custa da liderança dos EUA e dos nossos interesses. FIM DO RESUMO.

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O LIVRO DE REGRAS [orig. playbook] 
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2. A embaixada venezuelana em 2006 expôs em detalhes sua estratégia para o Paraguai, em documento semelhante a esse nosso. Aquele livro de regras articula o seguinte, como principais metas políticas e econômicas para a região:

Fortalecer a posição da Venezuela na economia internacional. Embora os termos sejam grandiosos e nebulosos, reforçam o desejo de Chavez de transformar o campo de jogo na América Latina, com a Venezuela no comando do jogo.

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ESFORÇOS POLÍTICOS PARA ROMPER A DEMOCRACIA 
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3. (S/NF) Chavez envolveu líderes políticos na região para que promovessem sua visão da região sob a bandeira da Solidariedade Latino-americana e Integração, como parte de uma campanha que muito investe no contato pessoal. Também se dedicou a engajar as populações locais para que promovam sua imagem como generoso fornecedor de projetos de ajuda social, pintando uma imagem dos EUA como elitista e favorecedor só do big business. 

Enquanto isso, clandestinamente, o governo da Venezuela oferece dinheiro e apoio material a grupos esquerdistas simpáticos aos bolivarianos, usando para isso as embaixadas da Venezuela na região, quase sempre como parte de uma campanha para ganhar cada vez mais influência, inclusive em resultados eleitorais em eleições de líderes políticos e organizações chaves, algumas das quais mantêm íntima relação com o presidente Kirchner. 

Kirchner atualmente não vê problemas em manter relacionamento próximo com Chavez, sobretudo em ano eleitoral, uma vez que Chavez continua relativamente popular na Argentina – 52% dos argentinos tinham opinião favorável sobre Chavez em dezembro de 2006 –, enquanto os EUA não são populares. Kirchner tentou manter-se publicamente distanciado das posições antiamericanas de Chavez e tentou manter a percepção de uma linha mais independente, para não afugentar a maioria dos eleitores, mas sua estratégia econômica visa, claramente, a criar laços comerciais e financeiros mais estreitos com Chavez, posicionando-se entre Chavez e Lula no espectro político regional.

Ao mesmo tempo, Kirchner procura equilibrar seu relacionamento com Chavez. Isso é evidente no apoio que Kirchner e a esposa tem demonstrado à comunidade de judeus venezuelanos, ao mesmo tempo em que ainda não deram qualquer apoio público à liberdade de expressão ou à RCTV por exemplo, presente em todos os nove estados bolivianos e muito ativos em outros setores do governo boliviano. 

O governo de Morales mantém processo de consultas freqüentes com Chavez e os dois mantêm relações profundas. O Embaixador Venezuelano à Bolívia, Julio Montes, jurou publicamente em outubro de 2006 que correria sangue venezuelano, ao lado de sangue boliviano, se a revolução boliviana fosse ameaçada. E Chavez é popular tanto entre a classe política (jornalistas de política) como entre o público em geral. 

Chavez é cada vez mais visto como rival emergente de Lula, competindo ambos pela liderança regional e ameaça ao tipo de integração progressiva latino-americana que vários governos brasileiros já tentaram encorajar. 

Contra o quadro de pouco favorecer Chavez, Lula teve um movimento favorável, quando publicamente apoiou a reeleição de Chavez e elogiou os benefícios da integração econômica com a Venezuela, apesar de, privadamente, lamentar o comportamento imprevisível e errático de Chavez e retórica grandiloquente. 

Tudo leva a crer que Lula continuará nesse modo e parece preparado para deixar que a crítica política, em relação a Chavez, separe os dois. Isso por duas razões: por causa das prioridades da política externa do Brasil com a Venezuela; e porque há alguma simpatia ideológica residual entre Lula e seu círculo íntimo, e o fanado socialismo-populista da revolução bolivariana. 

Mas líderes chilenos reconhecem que Chavez é agressivo e que tem de ser vigiado de perto. A Inteligência do Exército do Chile (DINE) informa que a Embaixada Venezuelana financia grupos bolivarianos e de esquerda.

A presidente Bachelet é socialista com certa simpatia ideológica por Chavez, mas também é pragmática e reconhece que as políticas de livre mercado bem sucedidas no Chile e o modelo que deu estabilidade política ao país são preferíveis a qualquer oferta que Chavez faça. Resultado disso, o Chile continua a promover sem alarde o próprio modelo, e Bachelet não se oporá publicamente a Chavez.

Muitos líderes paraguiaos (tanto da oposição quanto do Partido Colorado que está no governo) desconfiam dos motivos que inspiram Chavez e têm manifestado preocupação com sua interferência na política interna do Paraguai. O acordo entre Venezuela e Bolívia para fortalecer a ajuda militar que a Bolívia recebe também aumenta essas preocupações. 

Ao mesmo tempo, o presidente Duarte deu um passo à esquerda, na retórica, e aplaudiu a visão chavista ao longo dos últimos dois meses; está tentando superar a ameaça, contra o poder dos Colorados dentro do governo, para as eleições de 2008, representada pelo padre esquerdista Fernando Lugo, que lidera as pesquisas. 

Embora haja fracos sinais de que a campanha de Lugo esteja recebendo financiamento significativo, há quem diga que a Embaixada Venezuelana ofereceu-lhes apoio, por ordem direta de Chavez, e que a campanha de Lugo reagiu favoravelmente. 

Vários pequenos grupos, a maioria de estudantes ou organizações da sociedade no Paraguai recebem apoio financeiro e material da Venezuela, mas até agora são grupos pouco influentes na cena social; funcionários de prefeituras disseram a elementos dessa embaixada que a Venezuela oferece treinamento a líderes camponeses, para prepará-los para liderar movimentos sociais. A Venezuela pagou os custos das viagens de centenas de paraguaios pobres, que voaram até Cuba para fazer cirurgias nos olhos. A Venezuela parece estar conseguindo algumas conversões, no plano das massas – ao mesmo tempo em que as elites mostram-se cada vez mais preocupadas.

– No Uruguai, a influência da Venezuela cresce, mas ainda é pequena. Chavez esteve mais visível e mais ativo nas vésperas de a Venezuela entrar no Mercosul, mas depois seu interesse parece ter arrefecido. Muito funcionários uruguaios riem-se de suas falas, pelas costas dele. Mas em público, são rápidos em agradecer a Chavez e aproveitar-se das vantagens econômicas (sobretudo petróleo) que Chavez parece disposto a distribuir. Chavez, por exemplo, doou 20 milhões de dólares ao centro de tratamento de câncer de um hospital público (o presidente Tabaré Vazquez é médico oncologista e a doação parece visar diretamente a agradá-lo.) Chavez também investiu em empresas comerciais e financeiras que enfrentam dificulades.

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ESTRATÉGIAS ECONÔMICAS PARA ESTRANGULAR O LIVRE COMÉRCIO 
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4. (U) Chavez usa seus petrodólares para fazer avançar objetivos políticos e econômicos na região. Tem buscado agressivamente acordos de energia em troca de apoio a objetivos políticos, como, dentre outros, a admissão da Venezuela no Mercosul e a criação do Banco Bancosur. No processo, tem contribuído para crescente politização do Mercosul e feito aumentar a resistência contra a ALCA. (...)

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MERCOSUL: O RABO SACUDINDO O CACHORRO?
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5. A entrada da Venezuela no Mercosul claramente alterou o equilíbrio de poder e a dinâmica da organização. O Mercosul claramente evoluiu de união aduaneira imperfeita para organização política mais restritiva e antiamericana. Exemplo claro do dano que causou a entrada da Venezuela vê-se na questão do assento não-permanente no CSONU. Depois de mais de 50 votações sucessivas, os membros do Mercosul continuavam a apoiar a candidatura da Venezuela. Mas a solidariedade dos membros do Mercosul só durou até que se mencionou o Uruguai como outro possível candidato. A Argentina disse que vetou o movimento e o Brasil tampouco parece apoiar o Uruguai. Em várias ocasiões os ministérios de Relações Exteriores de Paraguai e Uruguai sinalizaram que teriam de consultar outros membros do Mercosul sobre questões chave de política exterior.

6. No Uruguai, é voz corrente que a inspiração para que o Brasil apóie a admissão da Venezuela ao Mercosul é a crença de que Chavez pode ser mais facilmente controlado de dentro da organização, do que se for deixado solto, fora dela. Considerado em geral, parece contrudo que Chavez pode ser ainda mais difícil de controlar do que os membros do Mercosul supunham. Chavez desafiou abertamente os brasileiros, ao apoiar e supostamente encorajar  Evo Morales a emcampar as instalações da Petrobras na Bolivia e várias vezes roubou a cena nas reuniões do Mercosul onde o presidente Lula do Brasil reinava. Esses atritos, por outro lado, abrem oportunidades. (...)

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O PODER DA MÍDIA DE MASSA 
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8. (U) Em vários países da AL, campanhas agressivas de doutrinação pela mídia induzem o apoio a Chavez e ao seu plano para constituir uma América Latina Bolivariana, como bloco de oposição aos EUA. A Telesur da Venezuela é a principal fonte de emissão de propaganda anti-EUA e visa sobretudo as populações rurais e mais pobres em todos os países da regiaçao. Essa embaixada suspeita que o governo da Venezuela esteja envolvido em operação para influenciar a mídia argentina, cujos veículos são abastecidos com retórica antiamericana. 

Na mídia impressa na Argentina, o jornal que mais claramente trabalha a favor de Chavez é jornal esquerdista pró-governo, Pagina/12. 

Pagina/12 não criticou o fechamento da RCTV, questão que todos os grandes jornais da mídia impressa na Argentina noticiaram como agressão à liberdade de imprensa (como La Nacion e Clarin. O Grupo Clarín, como é típico do tipo de jornalismo que faz é essencialmente neutro em relação a Chavez, que nem apóia nem critica declaradamente. Vários jornais fazem forte oposição a  Chavez, entre os quais La Nacion, Ambito Financiero e La Prensa.

O Governo da Argentina comprou 20% das ações sem direito a voto da Telesur e contribui, sobretudo, com conteúdo em termos de material para televisão. A Direct TV, com base em Miami mantém um canal dedicado à Telesur, mas o serviço só alcança pequena porcentagem de argentinos. Alguns programas diretos de Telesur são exibidos pelo canal estatal Channel 7, o qual, contudo, recentemente, tirou os programas de Telesur do horário nobre e passou a transmiti-los depois da meia noite. (...)

– Em abril de 2006, a Bolivia comprou 5% da Telesur a partir de Caracas, proposta por Chávez como alternativa latinoamericana à programação da CNN. (...) Pesquisas recentes mostram que cerca de 77% dos chilenos não aceitam o que Chavez oferece. 81% entendem que Chavez é movido por razões de autopromoção. A mídia negativa, em 2006, noticiou que muitos dos chilenos levados para serem operados [de catarata] na Venezuela acabaram cegos.

– O Uruguai é dono de 10% da Telesur (à qual fornece conteúdo) e o canal estatal tem transmitido quantidades maiores de propaganda conspiracional anti-EUA, nos últimos meses. Na mídia impressa, Chavez só conta com o apoio do esquerdista La Republica que o apóia abertamente nas manchetes, enquanto o conteúdo das matérias é mais moderado. Os jornais populares e centristas, em geral, fazem oposição a Chavez.

9. (S) No início de abril 2007, jornais brasileiros indicavam que a Venezuela tentava desacreditar as posições do Brasil, a favor da Venezuela, por vários meios. Por exemplo, no final de 2006, funcionários da Embaixada da Venezuela em Brasília foram acusados de oferecer dinheiro a uma fonte jornalística no Brasil, em troca da publicação de artigos pró-Chavez e anti-EUA. (ref. B) (...) 

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COMMENT
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11. (S/NF) A camapanha de Chavez para expandir sua influência no Cone Sul é multifacetada e depende fortemente, mas não exclusivamente de assistência generosa no campo da energia e acordos de investimento. É atraente para muitos dos despossuídos da região que ainda esperam pelos benefícios que a globalização lhes trará em termos de livre comércio e governança democrática. Ao integrar a Venezuela nas instituições existentes e criar novos corpos regionias, Chavez visa a unificar o Cone Sul sob sua visão. A campanha tem produzido resultados misturados. Alguns países mostraram capacidade para resistir à sedução da Venezuela, com seus pacotes de ajuda e investimentos. Enquanto a influência de Chavez expandiu-se significativamente na região, há líderes regionais que suspeitam de seus motivos e intenções. Muitos concordam com sua mensagem de que o Cone Sul e, de fato, toda a América Latina devem fixar uma identidade separada da hegemonia dos EUA, mas ressentem-se dos EUA ou de outros que definam a mensagem deles. Os EUA não podem esperar que líderes regionais mobilizem-se para nos defender. Cabe aos EUA sermos mais proativos e defender nossa causa e implementar nossa estratégia transparente para a região. 

Nossa visão de uma comunidade democrática inclusiva de nações, que ofereça perspectivas de futuro mais próspero para seus coidadãos é a resposta certa para Chavez. Essa embaixada apresentará sugestões reunidas nas embaixadas da região, de o que fazer para responder melhor. Claro que precisamos de melhores recursos e de melhores ferramentas para fazer frente aos esforços políticos da Venezuela, que visa a fazer fracassar as estratégias de economia democrática, e impedir que se fixem no Mercosul as políticas favoráveis ao estreitamento dos laços de defesa comum e campanhas de mídias de massas.

12. (U) Colaboraram para esse telegrama as embaixadas de Asuncion, Brasília, Buenos Aires, La Paz, Montevideo e Santiago. [assina] CASON

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