terça-feira, 17 de maio de 2011

PALESTINA: Acordo Fatah-Hamás

Imprensa árabe e Khaled Meshaal pós-reconciliação 
13/5/2011, Middle East Monitor
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu


Khaled Meshaal
Correspondentes no Cairo do jornal Al-Sharq Al-Awsat [Oriente Médio] publicado em árabe em Londres, citaram Khaled Meshaal em longo artigo no qual dizem que o mundo árabe testemunhará afinal uma abordagem integrada de interesses que não conflitam entre eles, porque, afinal, dão um passo na direção de atender interesses islâmicos, nacionais, árabes e humanitários que jamais conflitam. A aspiração dos árabes será afinal alcançada, dizem os correspondentes, o que justificará a abordagem integrada dos problemas, que afinal começa a surgir como horizonte. 

“Quero ver toda a nação árabe aberta ao mundo em atitude de moderação positiva, sem que, para isso, tenha de ceder todas as suas potências de resistência” – disse Meshaal. “Queremos traçar um novo mapa político na região, que todos se unam numa só frente, de tal modo que se possam tomar decisões que manifestem políticas árabes bem sucedidas, tanto no plano interno como no plano externo”. 

Meshaal destacou que todos querem virar a página e livrar-se das divisões na frente palestina. “Essa fase acabou”, disse ele. “E estamos implantando medidas e procedimentos muito sérios, para impedir que aconteça outra vez”. Há hoje oportunidade para maximizar os papéis do Egito, da Turquia, de estados árabes, para impedir a ameaça de interferência negativa, vinda de fora. 

Perguntado sobre o que pensa o Hamás sobre o assassinato de Bin Laden, Meshaal disse que “Discordamos da al-Qaeda em muitos pontos, sobretudo nas táticas que provocam a morte de civis inocentes. Mas isso não dá direito aos EUA de eliminar árabes e muçulmanos, agindo à margem da lei.”

Falando sobre o moribundo processo de paz, Meshaal falou da necessidade de uma ampla estratégia árabe e palestina para por fim ao impasse que já dura 20 anos. Essa estratégia, disse ele, exige ação democrática, resistência contra a ocupação israelense, esforços no campo legislativo e pressão total sobre Israel, em todos os campos e em todos os momentos, para conquistar direitos dos palestinos e estabelecer um estado palestino independente.

O comandante político do Hamás disse que o movimento mantém relacionamento positivo com a Europa, mas ainda não tem posição definida em relação a Washington. Considera bem vindo um diálogo não condicionado com as potências mundiais. Meshaal disse que considera Benjamin Netanyahu responsável pela morte do processo de paz, porque obstruiu qualquer tipo de negociação que contribuísse para a libertação de prisioneiros políticos palestinos em troca do soldado israelense Gilad Shalit, capturado quando desenvolvia ação de guerra contra o povo de Gaza.

Segundo Meshaal, “não há divisões internas no Hamás, mas há opiniões diferentes e somos organização democrática”. O movimento é conduzido por lideranças eleitas; todas as decisões são examinadas pelo Gabinete Político e por um Conselho Consultivo eleito. “Concordamos e discordamos, o que é garantia de processo saudável, mas quando as questões chegam ao voto e são votadas, todos passam a trabalhar a favor da decisão da maioria.” 

A situação na Palestina, disse ele, é diferente do que se vê em outros estados árabes nos quais houve revoluções, porque todos são contra a ocupação israelense e todos sabem que qualquer divisão é contraproducente. “Desde o primeiro dia da cisão, todos sempre tentaram alcançar novamente a unidade”, diz. Os palestinos também se beneficiaram com os efeitos da Primavera Árabe e das respostas sistematicamente hostis de Netanyahu, porque foram fatores que empurraram os palestinos na direção da reconciliação interna.

De agora em diante, disse Meshaal, a resistência será sensível à “realidade da reconciliação”, e também o discurso da imprensa. As decisões políticas e militares serão consensuais, de modo a não permitir que diferenças internas criem qualquer tipo de risco extra ao processo de reconciliação. Ficou acertado, disse ele, que os prisioneiros políticos serão libertados o mais rapidamente possível e haverá prazo para que se definam os nomes que comporão uma liderança provisória. O governo provisório “não será sufocado por problemas da situação política, mas terá tarefas específicas a cumprir (como a organização de eleições)”.

Khaled Meshaal disse também que unir-se à OLP (Organização de Libertação da Palestina, antes do acordo dominada pelo partido Fatah) é direito de todos, porque “todos, na Palestina, somos parceiros”. Esse espírito deve reger a nova estrutura de liderança da OLP, cuja construção é parte do acordo de Makkah.

Sobre o processo de paz, Meshaal disse que os palestinos há 20 anos testam as intenções dos israelenses. “Hoje, em nome da segurança do Egito e nos termos do acordo de reconciliação, todos os palestinos concordamos em dar a Israel mais uma oportunidade.” Contudo, disse que os palestinos devem preparar nova estratégia, “porque temos uma oportunidade de ouro para derrotar o bloco contrário à paz que há em Israel.” Tudo o que se fez até o acordo e agora, do acordo em diante, foi e continuará a ser feito “nos melhores interesses do processo que nos conduzirá à paz.” 

Os palestinos não mais aceitarão condições impostas “não importa quem imponha e que condições sejam impostas”, seja sobre o acordo de reconciliação ou qualquer ou aspecto da resolução dos atuais conflitos. “Se o lobby pró-Israel espera que aceitemos as suas condições sobre acordos políticos”, Meshaal fez questão de destacar, “então terão de aceitar nossas condições sobre resultados futuros de eleições para o Parlamento de Israel”. Todos os palestinos, inclusive o Hamás “estão preparados para conversações com a Europa e com os EUA, mas sem precondições.” 

Meshaal disse que há contatos “positivos” entre o Hamás e a Europa. “Com os EUA mantemos relacionamento extra-oficial, graças aos esforços empreendidos pelo ex-presidente Jimmy Carter”. Quanto ao atual governo Obama, disse Meshaal, o Hamás ainda não tem posição definida. “Estamos à espera do resultado do trabalho dos egípcios nesse campo, que esperamos sejam bem sucedidos. E, de Israel, não esperamos grandes novidades.” 

Perguntado sobre como vê o processo de paz, Meshaal perguntou “De que paz você fala? Nós queremos paz para os palestinos na Faixa de Gaza, na Cisjordânia, para os palestinos da Diáspora e para os palestinos que vivem dentro da Linha Verde [dentro de Israel], e estamos atentos também aos direitos do povo palestino. Depois de estar constituído o estado da Palestina, então sim, poderemos falar melhor sobre paz e sobre Israel”. 

Quanto ao número sempre crescente de estados que já reconheceram o estado palestino, Meshaal disse que os direitos do povo palestino vão além do reconhecimento de um estado: “O mais importante é que as forças israelenses de ocupação retirem-se de volta aos limites das fronteiras que havia dia 4/6/1967. E, para que exista estado da Palestina, é preciso que os palestinos tenham plena soberania nos céus, terra e águas, que possam administrar suas próprias riquezas em benefício do próprio povo e que não haja colônias exclusivas para judeus em território palestino.” Perguntado sobre se o Hamás deslocaria seu quartel-general, da Síria para o Egito, Meshaal disse que “nada há de verdade nas matérias de imprensa que têm falado sobre essa mudança, e nada se alterou, na nossa situação na Síria, que tornasse necessária essa transferência.” 

O correspondente no Cairo de The Quds Press perguntou a Meshaal sobre um acordo para reabrir a passagem de Rafah na fronteira entre o Egito e Gaza. Meshaal respondeu que detalhes dessa decisão serão discutidos com o Egito, “mais adiante”. O Hamás, disse ele, esperará que o Egito recomponha suas condições de estabilidade, para assim poder assumir papel mais decisivo no mundo árabe.

“A Faixa de Gaza é questão de segurança e linha de defesa do Egito. Não queremos jogar sobre o Egito o problema de Gaza, mas tampouco deixaremos escapar o peixe que nos interessa fisgar, que é Israel, não o Egito. Gaza continua como território oficialmente ocupado por Israel, mas isso não é impedimento para a abertura da passagem de Rafah.” 

Meshaal disse ao jornal Quds Press e a outras agências de notícias que o Hamás deseja constituir “um outro eixo árabe, que apóie a resistência, usando meios diplomáticos, positivos e moderados.” Disse que as ameaças que têm partido de Israel depois da reconciliação entre Fatah e Hamás “são tentativas para confundir e encobrir a questão palestina”. “Dos inimigos”, disse Meshaal, “deve-se esperar qualquer coisa. Deve-se esperar que Israel tente fazer abortar a reconciliação dos palestinos.”

A frente palestina unificada, disse ele, construiu um consenso sobre como enfrentar a “as repetidas provocações do inimigo, com prisões na Cisjordânia e assassinatos em Gaza”. “Um Alto Conselho de Segurança definirá as políticas a serem seguidas, com a Cisjordânia e a Faixa de Gaza trabalhando juntas e coordenadamente.” O governo do Cairo, disse Meshaal, “está formando uma equipe, de egípcios e árabes, que dará apoio à implementação do acordo de reconciliação”. 

O Hamás espera que o novo governo egípcio não usará o movimento e a Fraternidade Muçulmana como alguma espécie de ‘espantalho’, para manter o povo dividido. “A Fraternidade Muçulmana é assunto dos egípcios; o Hamás é assunto dos palestinos. Cada grupo deve trabalhar no seu próprio campo, com sua específica sensibilidade política, para eliminar qualquer resíduo que tenha sobrado dos tempos da era Mubarak.” 

A Agência Reuters publicou declarações de Meshaal em que conclama os EUA e a União Europeia a apoiar o acordo de reconciliação entre o Fatah e o Hamás [1], dizendo que a reconciliação é escolha do povo palestino. Em entrevista à Reuters, Meshaal disse que o reconhecimento de Israel pelos palestinos não pode ser discutido, antes de haver estado independente na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.

“Esperamos que europeus e norte-americanos apoiem nosso direito e não trabalhem contra”, disse ele. “A comunidade internacional deve pressionar Israel para que reconheça um estado palestino, não o contrário”. Repetiu que é preciso que a resistência, popular ou armada, pressione Israel. Perguntado se o Hamás estaria preparado para reconhecer Israel, disse que “Antes, é preciso reconhecer e fazer valer o direito dos palestinos a um estado independente.”

A página da rede Aljazeera na internet disse que Khaled Meshaal e o Hamás não têm qualquer objeção a que o presidente da Autoridade Palestina Mahmoud Abbas beneficie-se de alguns dos efeitos da reconciliação; tudo está sendo feito com vistas a atender interesses dos palestinos. O Hamás, disse Meshaal, há muito se livrou do peso dessas formalidades. Disse à Al Jazeera que cabe a Abbas usar o acordo para pressionar os EUA e Israel.

Perguntado sobre Mahmoud Abbas ter-se recusado a sentar ao seu lado, Meshaal comentou que “todos têm de aprender a conviver com alguns efeitos práticos da reconciliação, para não comprometer a eficácia do próprio acordo”. O Hamás escolheu não desperdiçar nenhuma chance de fazer o que os palestinos esperam que seja feito, e também os egípcios, que tanto trabalharam para viabilizar a reconciliação.

“Acho que todos, também o Fatah, têm de buscar suas melhores energias, temos de conseguir que as forças da solidariedade operem a favor dos palestinos. Mas não se deve subestimar a influência de Netanyahu, interessado em fechar todas as portas.” 

Sobre os próximos passos da implantação do acordo, Meshaal destacou três pontos do acordo entre Fatah e Hamás:

1. Libertação imediata de prisioneiros políticos presos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.
2. Fixação de data para reunião que delineará o novo quadro de comando da OLP.
3. Fixação de prazo para discussão detalhada entre Fatah, Hamás e outros grupos, sobre formação do governo provisório, formação do Alto Comitê de Segurança e outras questões de segurança.



Nota de tradução:

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