segunda-feira, 13 de junho de 2011

Reflexões para um final de domingo

Alfredo Pereira dos Santos

A.P.Santos

Hoje o Canal Brasil falou sobre o grande geógrafo baiano Milton Santos. Isso por volta das 18h. Por curiosidade dei uma circulada por outros canais para ver o que estava passando. Num dos canais o Gugu fazia uma imitação grotesca da “Escolinha do Professor Raimundo”, que nunca foi grande coisa. Num outro o William Bonner e a Fátima Bernardes tentavam fazer o espectador acreditar que não “venderam a alma” (apenas uma metáfora). Num outro o notório Senor Abravanel distribuía dinheiro para tentar se redimir, aliviar a sua consciência ou lá o que fosse. E fiquei me perguntando o seguinte: que ínfima parcela do povo estaria vendo um programa sobre a vida do Milton Santos?

Findo o programa sobre o Milton e sem nada que valesse a pena ver na TV a mulher sugeriu que revíssemos o CONRACK, filme baseado numa história verdadeira, que é a de um jovem professor da Carolina do Sul que vai ensinar numa ilha daquele estado norte-americano, habitada apenas por negros.

Enquanto aguardávamos a água do chá ferver demos uma circulada nos canais da TV e vimos o Silvio Santos perguntar à legião de mulheres, jovens na maioria, que freqüenta o seu programa dominical, quem tinha proclamado a república no Brasil e em que data. Diversas pessoas se apresentaram com as respostas mais absurdas. A primeira respondeu Pedro Álvares Cabral. A segunda disse que foi Tiradentes. Outra que foi Dom Pedro I. Uma senhora finalmente disse Deodoro, mas errou no ano, pois achava que a república foi proclamada em 1882. Dai por diante o auditório já sabia parte da resposta e tinha apenas que acertar a data. As pessoas seguintes disseram que foi em 7 de setembro, 15 de novembro de 1500 e 22 de abril de 1500.

Depois de muito custo apareceu alguém com a resposta correta.

Foi a mesma dificuldade para achar alguém que dissesse quantos centímetros tem um metro.

Tem uma peça do Nelson Rodrigues chamada “Bonitinha, mas Ordinária”. Uma peça sobre essas “colegas de trabalho” do Sílvio Santos bem poderia se chamar “Bonitinhas, mas de cultura e inteligência ordinárias”.

Note-se que estamos falando de São Paulo e não do interior de Alagoas ou do Acre. São Paulo há muitos anos governado pelo PSDB. É um fato sabido que a educação brasileira está um descalabro, mas eu nunca poderia imaginar que tivéssemos decaído tanto. Pode ser que o conhecimento de nomes de personagens da nossa história bem como o de datas de eventos significativos não seja mais importante, mas o fato é que essas coisas a gente não esquece. O que está acontecendo? As pessoas perderam a capacidade de se lembrar das coisas? E conversão de unidades métricas, não se ensina mais nas escolas?

Em 2008 eu perguntei a uma professora de português o que a escola dela estava programando em comemoração aos cem anos da morte do Machado de Assis. Verifiquei que ela estava completamente desinformada a respeito, mas ela se justificou dizendo que “não era boa de datas”. Se os professores não são bons de datas o que se esperar dos alunos?

Não faz muito tempo eu li numa revista um artigo onde o autor, um psicanalista, dizia que hoje em dia o professor tem que ser uma espécie de “animador cultural”. Não dá mais para dar aulas à moda antiga em tempos de televisão, computadores e Internet.

O curioso é que o Conrack, o professor do filme a que me referi, era um desses “animadores culturais”. E isso há algumas décadas. Essa é a razão pela qual eu achei que seria bom que professores vissem o filme, tendo-o recomendado a diversos deles. Ninguém se interessou. Há que se ressalvar, contudo, que o pré-requisito para ser “animador cultural” é ter cultura, coisa que o Conrack tinha, mesmo sendo jovem.

O filme não tem um final feliz. O Conrack foi demitido porque, entre outras coisas, recusava-se a educar as crianças na base do chicote, como preconizava a diretora da escola, que era negra, como os demais moradores da ilha; e também porque não achava justo que apenas os brancos fossem para a universidade enquanto que os negros ficassem eternamente colhendo algodão. Ademais, era afetuoso com as crianças, que gostavam dele, enquanto que quem tinha o poder de demití-lo achava que professor “tinha que ter autoridade”. Autoridade que, no caso, significava manter-se frio e distante dos alunos, tratando-os com rigidez e disciplina severa, para o que castigos físicos podiam ser empregados.

Não resta dúvida: o sistema é estúpido.

Um comentário:

  1. Caro,

    boa noite.
    Gostei da sua reflexão e da dica sobre o filme. Vou procurar e assistirei.

    Meu sincero muito obrigado.
    Abraços e ótima semana,

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