domingo, 11 de novembro de 2012

Obama reeleito: mais e menos


11/11/2012, Lawrence Davidson, Consortium News
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Lawrence Davidson
Barack Obama obteve a reeleição dia 6/11 – e a reação de muitos na esquerda foi: “E daí?”. Ora! Fomos poupados de quatro anos de Mitt Romney. E a esquerda, outra vez: “E daí? São todos farinha do mesmo saco”.

Sim, talvez sejam, mas até farinha do mesmo saco pode variar. Ofereço aqui algumas diferenças positivas e, depois, algumas semelhanças negativas em relação a Romney e seus assessores conservadores. Comecemos pelo lado mais alegre:

– Em termos de probabilidades, os EUA, sob Obama estão menos expostos ao risco de, de repente, nos descobrirmos já em guerra contra o Irã, o que aconteceria no caso de Romney ser eleito. Nas questões da guerra no Oriente Médio, Obama parece capaz de pensar com relativa independência; Romney, como ele próprio disse, não vê diferença alguma entre interesses dos EUA e interesses de Israel.

– Obama tomou atitude sensível, pode-se dizer, em relação aos levantes da Primavera Árabe, exceto, claro, no Bahrain, onde o seu governo manteve o apoio à monarquia, o que foi lamentável. A reação de Romney à Primavera Árabe seria telefonar para Netanyahu e consultá-lo sobre o que fazer.

– Nas questões dos direitos para mulheres, para os gays, relacionados ao meio ambiente e nas questões de educação, qualquer governo Obama sempre será preferível a qualquer governo Romney.

– Se houver vagas a serem preenchidas na Suprema Corte nos próximos quatro anos, estamos menos expostos ao risco de o presidente indicar juízes conservadores extremistas fundamentalistas em governo de Obama, que em governo de Mitt Romney.

– Obama proibiu a tortura que Bush oficializou. Se se consideram os assessores neoconservadores de Mitt Romney, é razoável temer que seu governo cedesse à tentação de reoficializar a tortura nos EUA.

Obamney Combo
As similitudes

Aí ficam listadas algumas coisas positivas, que não se pode dizer que não tenham importância. São importantes. Mas Obama arrasta também um lado obscuro que, às vezes, faz eco à mentalidade dos Republicanos mais conservadores. Para citar algumas dessas sombras:

– Barack Obama é negro afro-americano com, ao que parece, a cabeça cheia de ideias seletivas em matéria de liberdades civis. Deu emprego a outro negro afro-americano, Eric Holder, em cuja cabeça há os mesmos pontos cegos. Holder comanda o FBI e permitiu que a agência se pusesse a caçar elementos de outro grupo minoritário, dessa vez, muçulmanos, envolvendo-os em supostas atividades terroristas as quais, sem o esquema do FBI, praticamente com certeza, jamais teriam sido executadas.

– Durante seu primeiro mandato, Obama pôs-se a caçar “estrangeiros ilegais”, deportando-os aos magotes; e só modificou essa política quando as eleições se aproximavam. Nesse front, Obama absolutamente não merece confiança alguma.

– Obama continuou a aplicar políticas criminosas do presidente Bush, muitas das quais foram institucionalizadas na “Lei Antiespionagem” [orig. Patriot Act] e leis correlatas. Dentre essas políticas criminosas, estão práticas inconstitucionais, como a detenção por tempo indefinido e as escutas clandestinas, não autorizadas.

– E, muito embora a política de Obama para o Oriente Médio provavelmente não nos leve à guerra tão ardentemente ansiada por Netanyahu, primeiro-ministro de Israel e amigo de Romney, Obama continua dedicado a usar seus drones para assassinar civis e a usar suas sanções draconianas para também matar civis, em muitos casos, de fome.

A minoria de Romney

A eleição, propriamente dita, não trouxe resultados tranquilizadores. Basta examinar o mapa que mostra quem venceu em quais estados, e o que se vê é uma assustadora onda vermelha (e quanto ao motivo pelo qual a imprensa-empresa decidiu pintar de vermelho os estados Republicanos, apenas uma geração depois do fim do comunismo russo, aí está um fenômeno superior à minha capacidade de compreender!).
 
Resta, à guisa de consolo, que os estados “vermelhos” são (exceto o Texas) os menos populosos. Mesmo assim, segundo os números finais da eleição publicados no Philadelphia Inquirer (8/11), coisa como 57.591.058 de norte-americanos votaram em Romney, sujeito que pode ser facilmente confundido com o “camaleão anão”, um subgrupo dos camaleões com grande talento para “ajustar as cores da própria camuflagem conforme o olhar das espécies” que o desafiem.

Dos eleitores de Romney, 62% são homens brancos e, mais surpreendentes, 56% são mulheres brancas. Será que toda essa gente votou mais contra Obama, que a favor de Romney? Ou não passavam de bons pacientes para serem usados em shows de hipnotismo e de mentira-encenação coreografados por especialistas?

Depois da vitória, o presidente reeleito fez discurso do tipo “agora vamos, unidos para sempre” o qual, nas atuais circunstâncias, foi embaraçoso, ruim de ouvir.

Depois de termos, tantos de nós, como o presidente, passado meses e meses sob fogo cerrado de ofensas e difamações, ridicularizados sem trégua, preferiríamos ver algum tipo de “resposta” pública, uma reação qualquer, uma vírgula, que fosse, de reação contra a campanha suja dos Republicanos. Seriam sentimentos humanos e adequados às circunstâncias.

Mas, na opinião de Obama, embora alguns até possam discordar “ferozmente”, a montanha de ofensas e desaforos e mentiras e calúnias que assacaram contra ele e contra seus seguidores não passou de manifestação “ruidosa, confusa” de democracia. Segundo o presidente Obama, apesar da guerra imundíssima de que fomos vítimas, todos nós desejamos o mesmo tipo de EUA.

Não, não concordo. Os Republicanos e neoconservadores militaristas do Tea Party não desejam o mesmo tipo de EUA que Obama deseja (ou, pelo menos, eu e muitos outros sinceramente esperamos que Obama deseje). Aposto qualquer coisa que nem John A. Boehner, presidente da Câmara de Deputados controlada pelos Republicanos, deseja os mesmos EUA que Obama deseja!

Pois mesmo assim, na noite da vitória, Obama disse aos seus apoiadores que “acabo de falar com o governador Romney e... Estou ansioso para sentar com ele e conversar sobre o muito que podemos fazer juntos para levar avante esse país”.

Pode não ser oferecimento apenas pro forma, gesto gracioso do vencedor, que estende uma mão conciliatória. Estou convencido de que Obama quer, sim, fazer exatamente o que disse, porque, no âmago do âmago de seu coração, Obama é homem que cede, é homem de concessões. Concederá praticamente qualquer coisa a qualquer um, em praticamente qualquer negociação.

Considerada a estrutura política dentro da qual Obama vive, isso implica que ele fará concessões aos mais cruéis e gananciosos Republicanos, sionistas e neoconservadores – bastando para tanto que eles “ouçam a razão” - e deixem-se convencer por Obama. De fato, a única provável exceção nessa lista são os norte-americanos progressistas que, parece, são vistos por Obama e seus assessores como grupo limítrofe, quase periférico, cujos objetivos e valores não merecem a mesma consideração.

Por tudo isso, os primeiros indicadores sugerem que o segundo mandato de Obama será bastante semelhante ao primeiro. Embora, sim, muitos dos seus apoiadores entendam que não, nada disso, porque engoliram aquele verso sedutor da trilha sonora que diz que “o melhor ainda está por vir”.

Como disse-me um obamista, semana passada, “agora tudo será diferente em Washington, porque Obama provou que a maioria está com ele”. Pensei com meus botões que... Ora bolas! Isso já ficou provado em 2008.

A lista de desejos de Obama

OK, OK, para os que confiam que, no segundo mandato, aparecerá um Barack Obama “com reais inclinações progressistas”, listo aqui algumas coisas que o presidente pode fazer para provar que as coisas não serão exatamente iguais. Muitos dos pontos seguintes foram inspirados em coluna recente de Juan Cole, “Lista de desejos do presidente Obama: Top Ten. [1]

– Obama pode propor e lutar com empenho para aprovar leis que neutralizem essa lei horrenda que criou os Citizens United e a qual, dentre outras coisas, reforça a farsa segundo a qual empresas são “gente” e podem votar e, portanto, os Super PAC têm direito de comprar eleições. Simultaneamente, o Obama “real” pode também investir algum capital político numa campanha decente a favor de uma reforma decente dos sistemas de financiamento de campanhas eleitorais.

– Obama pode empenhar-se a favor de forte regulação, sobretudo para bancos e todos os setores financeiros da economia.

– Obama pode lutar para fortalecer os direitos sindicais, tanto no setor privado, quanto público.

– Pode também trabalhar a favor de leis que tornem ilegais todos os esforços dos conservadores para limitar o direito de ir e vir dos cidadãos; pode dedicar-se, para começar, a pôr fim ao projeto de se emitirem documentos de identidade com foto.

– Obama pode remodelar todas as prioridades do FBI e de outras agências, afastando-as de qualquer missão que tenha a ver com a aplicação da Lei (inconstitucional) Antiespionagem; impedindo essas agências públicas de envolverem-se em esquemas terroristas com vistas a prender e a matar (mais) gente inocente; e impedindo-as, também, de qualquer prática que implique violência contra o direito à privacidade (proibir escutas clandestinas) de milhares de norte-americanos. Em outras palavras, o segundo mandato de Obama deve, afinal, mostrar um presidente eleito que se faz ver, publicamente, em clara oposição aos crimes da era Bush, hoje já travestidos e convertidos em “crimes legais”.

– Por fim, especificamente no que tenha a ver com o Oriente Médio, o presidente Obama pode:

a) parar de criar obstáculos aos esforços dos palestinos para obterem status de membros da ONU; e
b) declarar o perdão dos líderes da Holy Land Foundation, injustamente condenados em acusação de apoio a terroristas, num dos mais escandalosos erros judiciários do século 21.

E... o Barack Obama que se prepara para seu segundo mandato lutará por todas essas causas? Meu palpite é que esforços, se houver, serão, no máximo, mornos. E cada avanço, se houver, virá aguado, diluído em concessões e mais concessões e concessões sem parar. Não porque “política é isso”, ou “tem de ser jogada assim”, mas porque esse é o único modo pelo qual o Barack Obama real quer fazer política.



Nota de rodapé
[1]  11/7/2012, Informed Comment, Juan Cole em: “Top Ten Wish List Progressives should Press on President Obama

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