sábado, 13 de junho de 2015

Desdolarização: Rússia está falando (muito) sério


6/6/2015, [*] F. William Engdahl, New Eastern Outlook, NEO
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Desdolarização da Rússia
A Rússia está prestes a dar outro grande passo na direção de libertar o rublo, extraindo-o do Sistema-dólar. O Ministro das Finanças russo acaba de informar que está considerando lançar papéis da dívida do Estado russo em Yuan chinês. Seria via muito elegante para afastar-se de vez da dependência, das chantagens e das ações de terrorismo financeiro de que o Tesouro dos EUA fez meio de vida. E simultaneamente se estreitam os laços entre China e Rússia – o pior pesadelo geopolítico para Washington.
O Vice-Ministro russo das Finanças, Sergey Storchak, anunciou que seu Ministério está dedicado a estudo aprofundado do que se exige para lançar papéis russos denominados em Yuan, a moeda chinesa. Esse noticiário recente é parte de uma estratégia de longo prazo, entre Rússia e China, que alcança diretamente o coração da hegemonia norte-americana – US$ – no lugar de principal moeda de reserva mundial.
O US$ é usado hoje como principal moeda de reserva em cerca de 60% dos bancos centrais pelo mundo. A segunda é o € (euro). Agora a China se move cuidadosamente, como principal potência comercial do planeta, para criar sua Renminbi (o Yuan chinês) como mais uma dessas grandes moedas de reserva. É evento que tem enormes implicações geopolíticas. Enquanto o US$ for a principal moeda de reserva, o mundo tem de comprar dólares e papéis do Tesouro dos EUA para suas reservas. Isso é que tem possibilitado que Washington continue a acumular déficits em orçamento desde 1971, quando o US$ abandonou o padrão-ouro.
Na realidade, China, Japão, Rússia, Alemanha – todos países com balança comercial superavitária – financiam os déficits de Washington, o que torna possível para os EUA fazer todas as guerras que faz pelo mundo. É paradoxo ao qual Rússia e China, pelo menos, estão decididas a pôr fim o mais rapidamente possível.
Desdolarização
Ano passado, Rússia e China assinaram enormes acordos de energia, para 30 anos de fornecimento de petróleo e gás russo à China. Os pagamentos serão feitos em moeda local, não em dólares. Já em 2014, os pagamentos em moedas nacionais entre China e Rússia no comércio bilateral, aumentaram nove vezes, comparados a 2013. Lin Zhi, Diretor do Departamento de Europa e Ásia Central do Ministério Chinês de Desenvolvimento Econômico anunciou em novembro passado que:
(...) cerca de 100 bancos comerciais russos já estão abrindo contas para pagamentos recebidos do exterior em Yuan. A lista dos bancos comerciais nos quais depositantes comuns podem abrir contas em Yuan também está aumentando.
Em novembro passado, o 18º maior banco da Rússia, o Sberbank, tornou-se o primeiro banco russo a financiar letras de câmbio em Yuan.
Estratégia de longo prazo
O que tudo isso indica é que Rússia e China estão planejando cuidadosamente uma estratégia de longo prazo para sair da relação de dependência que as mantém ligadas à moeda dos EUA, algo que, como mostraram as sanções impostas à Rússia pelos EUA ano passado, torna os dois países vulneráveis ao impacto devastador das guerras de moedas que os EUA espalham pelo mundo.
A China acaba de ser aceita “em princípio” pelo Grupo dos 7 ministros de finanças, para ter seu Yuan chinês incluído na cesta de moedas que gozam de Special Drawing Rights (Direitos Especiais de Saque), que o FMI distribui entre seus membros. Hoje, só há nessa cesta o US$ (dólar), o € (euro) e o ¥ (yen) japonês. Incluir aí o Yuan será passo gigantesco para fazer da moeda chinesa mais uma moeda internacional de reserva; simultaneamente, enfraquece parte que corresponde ao dólar.
Desdolarização
As reservas estrangeiras chinesas consistem predominantemente de papéis em dólar norte-americano, principalmente bônus do Tesouro dos EUA – o que é uma fragilidade estratégica, porque em caso de guerra essas reservas podem ser congeladas – como o Irã já sabe muito bem. Para a China, é imperativo aumentar o conteúdo de ouro em suas reservas e diversificar o restante delas para outras moedas.
A China também acertou com a Rússia e o projeto russo da União Econômica Eurasiana a unificação da rede de ferrovias de alta velocidade da Nova Rota da Seda. Simultaneamente, Pequim anunciou que está criando fundo gigantesco, de $16 bilhões, para desenvolveu minas de ouro ao longo da ferrovia que liga Rússia, China e Ásia Central. Isso sugere planos para elevar fortemente a quantidade de ouro na composição das reservas chinesas. O banco central da China aumentou muito a quantidade de ouro em seu poder nos anos recentes, embora ainda não tenha divulgado se já ultrapassou as alegadas 8.000 toneladas de ouro que haveria no Federal Reserve. Espera-se que a China divulgue as dimensões de sua real reserva de ouro quando for formalmente aceita na cesta de moedas SDR-FMI, talvez adiante, ainda esse ano.
Ano passado, 2014, Song Xin, presidente da Associação Ouro China disse que:
Temos de criar nosso banco de ouro o mais rapidamente possível. (...) Ele nos ajudará a comprar reservas e dará mais peso à voz e aos controles da China no mercado de ouro.
Um fundo do setor ouro, que envolve países ao longo da Rota da Seda já foi criado no noroeste da China, na cidade de Xi’an, no mês de maio/2015, controlado pelo Bolsa de Ouro de Xangai [orig. Shanghai Gold Exchange (SGE)], parte do Banco do Povo da China [orig. PBOC]. A China é o maior produtor mundial de ouro. Dentre os 65 países ao longo das rotas do Cinturão Econômico da Rota da Seda, há inúmeros que se identificam como importantes bases de reserva e consumidores de ouro. Xinhua noticia que 60 países investiram naquele fundo, que facilitará o processo pelo qual os bancos centrais dos estados-membros poderão ampliar suas reservas de ouro.
O dólar e o rublo
O Dr. Diedrick Goedhuys, ex-conselheiro econômico do Reserve Bank da África do Sul, disse-me pessoalmente, numa entrevista:
Quero enfatizar a qualidade que só o ouro tem como ativo financeiro, de não implicar risco para ninguém. Um bônus do Tesouro, por exemplo, é ativo na minha mão, mas é risco, é passivo a ser resgatado, na contabilidade do Tesouro. O ouro, não. É exclusivamente ativo. O plano de mineração de ouro que o governo da China está executando é importantíssimo. É plano de longo prazo. Talvez ainda se passem dez anos antes de ele apresentar efeito significativo.
Agora, com Washington e Wall Street cada dia mais frustradas por não conseguirem derrubar o rublo e o renminbi, Rússia e China estão dando passos gigantes para livrar-se das cadeias do US$, movimento que pode libertar toda a humanidade, se completado corretamente.
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[*] Frederick William Engdahl é jornalista, conferencista e consultor para riscos estratégicos. É graduado em política pelaPrinceton University; autor consagrado e especialista em questõesenergéticas e geopolítica da revista online New Eastern Outlook.
Nascido em Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos, é filho de F. William Engdahl e Ruth Aalund (nascida Rishoff). F.W. Engdahl cresceu no Texas, e depois de se formar em engenharia e jurisprudência na Princeton University em 1966 (bacharelado), e pós-graduação em economia comparativa da University of Stockholm 1969-1970. Trabalhou como economista e jornalista free-lance em New York e na Europa. Começou a escrever sobre política do petróleo, com o primeiro choque do petróleo na década de 1970. Tem sido colaborador de longa data do movimento LaRouche.
Seu primeiro livro foi A Century of War: Anglo-American Oil Politics and the New World Order, onde discute os papéis de Zbigniew Brzezinski, de George Ball e dos EUA na derrubada do xá do Irã em 1979, que se destinava a manipular os preços do petróleo e impedir a expansão soviética. Engdahl afirma que Brzezinski e Ball usaram o modelo de balcanização do mundo islâmico proposto por Bernard Lewis.Em 2007, completou seu livro Seeds of Destruction: The Hidden Agenda of Genetic Manipulation. Seu último livro foi: Gods of Money: Wall Street and the Death of the American Century (2010).
Engdahl é autor frequente do sítio do Centre for Research on Globalization. É casado desde 1987 e vive há mais de duas décadas perto de Frankfurt am Main, na Alemanha.

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